26 maio, 2012

A mastectomia e sua eterna cicatriz psicológica



A cirurgia de mastectomia (retirada da glândula mamária) além de contar com uma variedade de técnicas, é realizada levando em consideração aspectos como tamanho, localização e comportamento do tumor. Seria apenas mais um procedimento cirúrgico se não impactasse tanto na psique feminina e se não fosse percebida como uma mutilação deixando sempre a sua marca na mente, no corpo e na alma.

Ontem tive a chance de conversar com uma mulher que foi mastectomizada e que já está realizando exames para se submeter à cirurgia reconstrutora. Durante os anos em que ficou no aguardo para a realização da cirurgia reconstrutora pelo (SUS) ela pode me contar sobre a sua experiência, as suas angústias, o seu medo, a sua espera e, principalmente, segundo ela falar sobre a gratidão e felicidade que sente em estar viva.

A nossa aproximação foi meramente casual. Éramos duas desconhecidas, sentadas na mesma mesa de um aniversário. O que mais me chamou a atenção foi no incômodo que ela sentiu quando a sua echarpe caiu e expôs a sua maior fraqueza - a ausência de um seio. E foi assim que começamos a conversar. Na verdade eu estava disposta a ouvir, a aprender com ela, a enxergar a mastectomia com os seus olhos e não com os meus.

Foi o aniversário mais proveitoso que já fui. Ouvi coisas lindas sobre superação, religiosidade (não confundir com religião), esperança. Mas também ouvi muito sobre sofrimento, dor, desesperança. Lembrei da minha curta estadia na Santa Casa de Misericórdia RJ em regime de estágio na época- em (Psicologia Hospitalar) quando li sobre o que Elisabeth Kubler-Ross definiu em seu livro "Sobre a morte e o morrer" sobre a reação psíquica determinada pela experiência com a morte onde distribuiu em cinco estágios que todas as pessoas passariam ao tomar conhecimento da sua própria finitude como: (negação e isolamento, raiva e barganha, depressão e aceitação).

E conforme a história de vida de T.M ia se desenrolando se passava um filme em minha mente. E eu considerava o fato de ser comigo. E se fosse comigo? Aproveito o espaço para chamar a atenção das mulheres para a necessidade do auto-exame (coisa que eu nunca fiz) sendo extremamente transparente com vocês. Só lembro que tenho seios quando vou comprar lingerie ou vou a tradicional consulta médica.

E foi aí que T.M me surpreendeu ainda mais quando ela faz uma espécie de solilóquio (falar consigo mesma) e finaliza o assunto com a seguinte constatação. Que eu fiquei até com medo de respirar para não interromper: "Muitas pessoas acham a vida ingrata, reclamam disso, reclamam daquilo. Mas nunca param para pensar como seria morrer. Morrer é tão natural quanto respirar. A diferença é quando você está consciente que está morrendo, você vê e sente o seu sofrimento, a sua dor se torna maior não por você. Mas pela triste constatação de saber que aqueles que você mais ama estão sofrendo com você. Só que você pode morrer e eles é que vão ficar com a dor da sua morte para sempre em suas memórias."

Não podemos esquecer a falta de fidedignidade que tem o relato acima. Pois tentei registrar exatamente da forma como ouvi. Mas o fiz sobre o registro da minha compreensão, com as minhas palavras tentando ser o mais fiel possível ao discurso original. As palavras não estavam ajeitadinhas assim. Elas eram mais espontâneas, mais livres, mais profundas e reveladoras do que é se perceber morrendo, definhando, lutando, "se agarrando a vida" com toda a sua força e vontade de potência.

A síntese de T.M foi tão linda, tão verdadeira, tão honesta que me permiti ficar imersa em meus pensamentos e nas sensações que aquelas palavras despertavam em mim por alguns segundos. Sabe aqueles encontros, aqueles momentos, aquelas pessoas que você agradece por ter vivido e conhecido? Ontem eu vivi essa magia, ontem minha alma saiu mais enriquecida deste encontro, ontem eu agradeci por ter conhecido um ser extremamente humanizado, humilde, com uma alma linda, contagiante e extremamente generosa ao compartilhar comigo as dores e as alegrias de uma vida, da sua história.

Ontem eu aprendi que quando ficamos doentes e fragilizados, o segredo é se "agarrar" em alguma coisa. Eu me agarraria na ciência, estudaria a minha doença, as possibilidades, minha mente é descrente e indisciplinada demais para se prender a uma religião. Mas é liberta demais para acreditar na magia da vida, nessa energia maravilhosa que reina, rege e vigora em cada ser vivo desse planeta. Essa é a minha fé, não em um deus (simples criação humana). Mas em uma força que está sempre disposta a entrar em sintonia comigo, sem abrir mão da minha condição humana. 

A ti, T.M, meus eternos agradecimentos por ter contribuído com o meu crescimento pessoal e profissional, por ter me feito mais humana, por te me reconectado com os meus fantasmas do passado, por ter me mostrado que não os controlo como sempre acreditei, por me mostrar que não tenho mais medo deles e sim respeito pelo o que são - fantasmas da mente são atemporais e mais vivos que usualmente costumamos pensar. Mas no fim, são apenas fantasmas.


Por Dani Souza



24 maio, 2012

Depressão ou hipotireoidismo?


A tireoide é uma glândula que fica no pescoço. Para facilitar a localização fica abaixo do famoso "pomo-de-adão." Tal glândula produz dois hormônios tidos como importantes para o funcionamento global do organismo, o T3 e o T4.

Tais hormônios controlam o funcionamento de vários órgãos e interferem diretamente no crescimento; ciclo menstrual/fertilidade; ciclo do sono e vigília; funções cognitivas como raciocínio e memória; temperatura corporal; força muscular, etc.

É justamente pela sua importância e respectivo impacto que a mesma exerce sobre o organismo e seus vários sistemas que o correto diagnóstico de hipotireoidismo se torna imprescindível para a manutenção da saúde do indivíduo. Durante a anamnese (entrevista psicológica) no item história médica; quando bem conduzida norteia o olhar do psicólogo a ponto de fazer futuros encaminhamentos após suspeitar de possíveis doenças e/ou contaminações.

Pessoas que têm hipotireoidismo podem procurar por ajuda psicológica por acreditarem estar com depressão devido à semelhança dos sintomas que são divulgados na mídia diariamente como se fossem exclusivos à depressão. Se realizada uma anamnese superficial realmente o hipotireoidismo poderá passar despercebido e o indivíduo não receberá o adequado tratamento ao qual um olhar atento e treinado "mataria" a charada ou ao menos cogitaria a possibilidade de.

Confira alguns Sintomas do hipotireoidismo

* Cansaço, apatia, desânimo, falha na memória, sono excessivo, queda de cabelo, ganho de peso, unhas quebradiças, etc. Se você preencheu alguns critérios dos expostos acima deve estar se perguntando: "Existe tratamento para o hipotireoidismo?" A resposta é sim. Seguindo o tratamento conforme orientação e prescrição médica a tendência será observar uma diminuição dos sintomas de forma lenta e gradual.

Se após a leitura deste post você ficou em dúvida ou preencheu alguns critérios ou identificou algum tipo de caroço na tireoide procure um médico e peça um exame de TSH (hormônio estimulante da tireoide) coletado através de exame de sangue.

Julguei interessante divulgar tal informação porque dependendo do serviço de saúde da sua região- na hora em que você começar a falar em desânimo, apatia e cansaço alguns profissionais tendem a encaminhar para a psicologia sem dar a devida atenção ao caso. 

Não raro, a pessoa se vê fazendo uma espécie de tour por várias especialidades médicas (se a mesma não tiver a sorte de encontrar de primeira um endocrinologista) a maratona poderá ser longa e dispendiosa com visitas até na psicologia. Quando não há espaço para uma escuta acolhedora e atenta, abre-se um leque para as possíveis falhas na comunicação que, por si só, já é repleta de ruídos. 

Por Dani Souza






16 maio, 2012

Transplante de órgãos, transplante de vidas?


O tema transplante sempre foi mobilizador de várias polêmicas, divergências, atravessamentos religiosos, etc. Além de despertar fantasias inconscientes, expõe a fragilidade da família e do receptor e/ou doador (no caso de doador vivo) e requer uma leitura psicológica para facilitar que tais medos, fantasias e expectativas sejam pontuadas, desmistificadas favorecendo um diálogo mais transparente e elucidativo entre equipe-paciente-família.

Culturalmente, o brasileiro não tem o hábito de discutir abertamente tais questões. Não raro, as pessoas quando se deparam com a própria limitação - coisa que a doença e o inesperado fazem com exatidão (te obrigam a reconsiderar toda uma vida, a replanejar e a se readequar a nova condição), nos deparamos com muitos paradigmas a respeito do tema que se não forem devidamente manejados poderão impedir tal procedimento ou impactar diretamente sobre o sucesso do mesmo.

E aí falamos de psicossomática, dos impactos que a ansiedade, o medo, o não entendimento do que realmente está acontecendo consigo mesmo podem agravar outros quadros médicos como diabetes, hipertensão e questões outras de ordem psicológica se refletindo no corpo e vindo à tona em um momento que se esperava total estabilização do quadro clínico do paciente.

É de fundamental importância que se faça um acompanhamento psicológico da família e do paciente para minimizar tais questões e para escutar o que a família pensa, qual o apoio que ela pode dar ao paciente e detectar quais são os pontos fortes e fracos de ambos durante esse processo (Não abordarei aqui a escassez de psicólogos no quadro técnico da rede pública e privada no Brasil).

O que mais comumente acontece é a sensação de que receber um órgão de uma outra pessoa possa trazer consigo algumas características do doador. Nessa hora as fantasias começam a aparecer e muitas dúvidas do tipo "Mas será que depois que receber o coração vou continuar amando as mesmas pessoas de antes?" ou "E esse fígado será que o doador bebia? Era uma boa pessoa?"

E quando esse momento surge nada como o respeito, a empatia e o esclarecimento para entender que de fato não é tão simples assim receber um órgão que foi de uma outra pessoa. Enfim, o tema requer muita ética e compreensão por parte da equipe médica e todos os envolvidos direta ou indiretamente no caso. 

Principalmente quando o paciente se mostra relutante e parece fazer de tudo para "dificultar" o seu próprio tratamento. Muito do comportamento não cooperativo (das resistências) vem do medo, de uma possível falha entre a comunicação da equipe-paciente, das fantasias que não encontraram espaço para vir à tona. É nesse momento que somos chamados para apaziguar o que é extremamente normal e esperado- o medo frente ao desconhecido, o medo de encarar a sua própria finitude, a dúvida se vai dar certo ou não... 


Por Dani Souza